MUITO OBRIGADO

 

No banheiro de um café colombiano tocado por um casal gay na zona rural do município de Guararema, no interior do estado de São Paulo, vejo um quadro em cima do vaso. Trata-se de uma impressão barata, em lona, de letreiros esteriotipicamente estilizados: “Café”, “Hotel”, Diner”; até Moulin Rouge. Começo a pensar que estou ficando louco. Percebo que é quase sempre assim: símbolos me dão pânico. A sensação de ter que sustentar a sua convencionalização — uma vez que, relativizados, passo a estranhá-los e ganhar consciência de sua arbitrariedade — leva à minha própria percepção enquanto alguém também profundamente arbitrário, que sustenta símbolos e convenções só para si. Um esquizofrênico, ainda mais diante de símbolos do capitalismo.

Mas a minha loucura nada mais é que a minha forma de pensar individualmente o que se chama, coletivamente, de “crise existencial” – algo que acometeria a “todos os homens” no ato de tomar consciência de sua dimensão “humana”. Ora, se penso no sol explodindo não penso que estamos danados, penso que não saberei mais sustentar o peso da reprodução social da vida se tenho consciência desse fato. E logo ficarei doido.

No entanto não quero produzir um texto de lamúria, quero produzir uma intervenção. Se, de uma forma ou de outra meu destino é a esquizofrenia, permitam-me ser propositivo e apresentar-me-lhes uma solução. Meu medo metafórico da loucura é também literalmente louco porque é um problema do qual sua lógica não permite saída: sendo uma problemática propriamente particular da minha ficção individual, não posso sair dela por qualquer concepção também individual. Nem, tampouco, do “coletivo” pensado por sua vez ele mesmo como um organismo colossal mas ainda unitário, todavia me é possível fugir desse esquema pela relação, pela participação, pelo compartilhamento. 

Assim agradeço a todos aqueles que são a condição necessária para que eu possa viver sem enlouquecer e encerro por aqui o meu lamento.

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DE VOLTA AO CHILE

 

Sinto saudades do Chile como quem sente saudades do futuro. Porque o Chile é o país do futuro. Não como um slogan, não como quem põe fé no progresso da evolução – pelo contrário, porque o Chile foi laboratório do neoliberalismo nos anos 70 e imagino que, após o capitalismo acabar consigo e com tudo, repovoaremos o mundo um pouco como os chilenos repovoaram o Chile. Sinto saudades do Chile porque se lembro de lá sei que a terra arrasada há de ser no entanto também uma terra reabitada, assim como quero muito acreditar que, apesar de seu fim, ainda será possível viver no mundo.

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